Encravado no coração da cidade, fica o Bairro Vermelho, o mais importante ponto turístico da capital holandesa. Amsterdam sem o Bairro Vermelho é como um jantar sem vinho ou um travesti sem pinto.
A atmosfera do lugar é para lá de estimulante. São mais de 300 cabines distribuídas pelas ruelas do centro histórico, alugadas por trabalhadoras da profissão mais antiga do mundo. O negócio sempre foi levado a sério. Elas são autônomas, pagam imposto de renda, têm seguro saúde e direito a dois meses de férias.
E é exatamente aí que está o nosso herói, acabou de dar os primeiros passos no pedaço e esbanja otimismo, já que ele aposta no seu charme de latin lover, certo de que as prostitutas do pedaço vão ficar caidinhas e cobrar menos por seus serviços.
Nada mal, raparigas. Quero 50% off e garanto dar 100% in. Hehehe, curtiram a piada? Pois é, além de dublê de ator pornô, sou humorista também. Vocês vão se encantar com a minha pessoa. Mas não se apaixonem porque odeio a prisão dos relacionamentos. I’m a free spirit, you know. Não se desesperem, sem tumulto. Peguem a senha e façam fila. Vai ter fuzarca para todas.
À medida que entra no distrito luxurioso, o jovem cartunista vai ficando cada vez mais animado. Sua cabeça se eleva, o peito infla e os pés se movem velozmente. Seu corpo está em festa, todinho ele, encharcado de testosterona feito um peru boiando no molho.
O lugar é um deleite para os olhos. As mulheres, vestindo trajes econômicos, se exibem nas vitrines, uma ao lado da outra, iluminadas por uma luz vermelha suave.
O cardápio é variado e tem para todos os gostos. Do comum ao exótico. Loira, morena, negra, asiática, magra, gorda, alta e baixinha. Basta escolher. Além do mais, é um lugar democrático. Todos os fetiches estão contemplados, não importa a sua tara.
Nosso herói caminha por um beco e se delicia ao ver a noiva recatada de véu e grinalda, a ninfeta perversa com uniforme de escola, a selvagem devoradora de homens e a anã de circo barbada se balançando em um trapézio. Mais adiante tem uma loira musculosa trajando roupas sadomasoquistas acompanhada de um pastor alemão. Adaô fica na dúvida se o cachorro está ali só para fazer companhia à moça ou faz parte do pacote e entra na esbórnia.
Na esquina uma ruiva linda com a expressão séria chama a sua atenção. O aspirante a beatnik se assanha todo e resolve arriscar. É agora ou nunca, pensa ele. Um, dois, três e já! Enquanto faz sinal para a beldade, sente a excitação aumentar a ponto de não haver mais espaço para o embutido maroto na samba-canção. A mulher atende a porta com um olhar mal humorado e diz, de forma ríspida:
— One hundred dollars for thirty minutes.
Ao ouvir o preço do cachê, nosso herói brocha. Cem dólares é a metade do seu orçamento para a viagem. Ele pensa em pedir um desconto e argumentar que tem ejaculação precoce. Faz a regra de três… trinta minutos, cem dólares, então, três minutos sairia dez. Mas ele prefere não dizer nada porque a mina parece não ter nenhum senso de humor. Percebendo que ele é um pé de chinelo, ela bate a porta na sua cara.
Mas o jovem cartunista não deixa a peteca cair. Ergue a cabeça e continua seu rolê pela zona. Já que está difícil transar, pelo menos pode tirar umas fotografias. Sim, quando se trata de mulheres e sexo, nosso herói não economiza nos filmes, por isso levou a câmera com ele. Depois é só revelar e apreciar os retratos na intimidade do seu quarto. Muito mais barato que uma fornicadinha.
Se achando o J.R. Duran numa sessão de fotos para a capa da Playboy, Adaô tira a Olympus da mochila e aponta para a deusa de ébano que posa em uma das vitrines de pernas cruzadas. O encontro dos dois pilares de carne dobram as circunferências das suas coxas e essa imagem o excita de tal forma que suas mãos tremem dificultando o ajuste do foco. Mesmo assim ele consegue alguns cliques.
Nesse momento, ele pensa em mandar algumas daquelas fotos para o seu pai, sem dúvida ia sentir orgulho do filhinho. Pai, sabe onde estou agora? Em Amsterdam, no Bairro Vermelho, a zona deles. Aqui as raparigas se exibem nas vitrines só de sutiã e calcinha. Parece mentira, mas as fotos provam que não estou delirando. Como agora sou um cartunista famoso em Paris e ganhei muito dinheiro, vou passar o rodo. No mínimo provar umas cinco e virar história na cidade. Amsterdam, enfim, vai conhecer a pulsão sexual dos Iturrusgarai.
Enquanto delira, Adaô acena para a deusa africana imaginando que ela vai ficar envaidecida quando perceber que está sendo fotografada. Só que acontece exatamente o contrário disso. Ao se dar conta, a mulher tem um acesso de fúria, abre a porta e despeja uma enxurrada de palavrões em cima do ex garanhão dos trópicos.
Assustado, Adaô recua como um caranguejo até sentir um puxão forte no braço arrancar a sua Olympus. Um grandalhão roubou a sua máquina e caminha apressado em direção à ponte. Nosso herói corre atrás dele pedindo sua câmera de volta. Era só o que faltava. Vai ao Bairro Vermelho e, além de voltar virgem, perde a câmera.
Continua.